quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A Margem da Imagem

“Ao mesmo tempo que é um mundo louco tem muito de lucidez”
Esta frase resume o contexto do documentário sobre como vivem os moradores de rua. Pessoas comuns, seres sociais que não se reconhecem como tais. Sem o conforto de um lar, sem segurança, sem emprego, sem condições de higiene e saúde cada qual tem sua história de vida, seus motivos para estarem lá, um começo, um meio e um fim. Com suas regras, seus meios de defesa, suas expressões. A perda da individualidade e da privacidade faz parte do cotidiano e cada um aprende a sua maneira as leis da sobrevivência.
Homens e mulheres com passado, história e cultura própria que compartilham a rua por vários motivos e cada um ao seu jeito mantém sua identidade privatizada das mais diversas formas. São excluídos do contexto social, da vida diária das cidades, dias e noites buscando uma maneira de sobreviver olhando a vida passar no movimento da cidade, na correria das pessoas, que desviam quando podem, por medo da aproximação, criando suas próprias raízes, suas famílias, seus companheiros, seus conflitos e desafios, sua própria cultura que passam para outros, como horário de comida gratuita, casas de apoio, albergues, etc.
Muitos tiveram passado, profissão, família, mas por algum motivo qualquer lá estão fazendo parte de uma sociedade sem nome, sem rosto, sem identidade e nem perspectivas, entrando no ritmo para sobreviver, num mundo em que a higiene, os valores sociais, o sexo, o amor, o respeito não tem hora e nem medidas, numa política de “salve-se quem puder”, cada qual cuidando do que é seu, particularmente, sem preocupação com a coletividade.
O álcool, as drogas contribuem para que o círculo vicioso de suas vidas permaneça inalterado. Na doença procuram atendimento gratuito nos hospitais públicos, mas a transmissão, o contágio e o contato com os outros não são controlados.
A preservação de suas histórias é feita por cada um de maneira própria, desenvolvendo capacidade de falar sobre cidadania, voto, educação, políticas sociais, políticos, saúde e bem estar de uma forma que transmite certeza do que estão falando: 
Momentos de lucidez? 
Ou momentos de loucura? 
Provocam curiosidade dos meios de comunicação, são retratados, comentados, fotografados, filmados por toda a espécie de imprensa que mostra as imagens como meio de ganhar dinheiro ou promoção social sem a preocupação com o ser humano que está por traz da imagem.
Pessoas que esperam por algo, por alguém que mude a situação. Governantes, sociedade, políticas sociais que consigam resgatar-lhes a dignidade.
Um governo mais humano, uma sociedade mais justa, políticas mais eficientes para resgatar aqueles que são considerados à margem da sociedade para o convívio social, a inclusão e não exclusão, através da educação e não da curiosidade, do apoio e não da exploração.
A sociedade tem medo de abrir a porta de sua casa ou o vidro do carro quando essas pessoas se aproximam. 
E eles do que tem medo? 
Da agressão, do descuido, do anonimato, do pouco caso que se faz, do finge que não vê e não sabe, da chuva, do sol, do frio, de esperar a boa vontade de alguém para comer, de pedir a Deus para morrer ou para sobreviver!?
A miséria e a economia contribuem para as questões sociais, e isso sempre fez parte de nossa história, desde o descobrimento do Brasil. Mas filmar e retratar esta imagem de pessoas cheias de razão e mostrar para autoridades e governantes não vai resolver, nada vai acontecer alem de alguns “Oh”! “Que coisa”! e até algumas lágrimas de emoção e pena, mas não passará disso. O filme acaba, os comentários são feitos, muitas críticas, alguns elogios, muitas falas e nenhuma ação.
Enquanto se fala, a população das ruas aumenta e continua fora de controle, longe dos olhos e das ações dos governantes.


Autora Nereide Salete Rossi

Um comentário:

Unknown disse...

Muito bem resumido o seu texto,estou fazendo um curso de aperfeiçoamento população em situação de rua,com foco na população negra.