Introduzindo
a questão...
Para tal análise, assisti ao filme Shrek e
realizei leituras de autores como Guacira Louro, Rosa Fischer, Henry Giroux,
Tomaz Tadeu, Sandra Corazza, entre outros. A escolha de tais autores ocorreu
pelo fato de abordarem através de seus estudos e pesquisas assuntos que tratam
sobre feminilidade, mídia, subjetividade, currículo, gênero, questões estas que
discuti na análise.
Primeiramente, inicio com uma discussão
sobre a mídia, considerada aqui como sendo todos os meios de comunicação em
massa, bem como sua influência na formação da identidade das pessoas. As
imagens veiculadas são carregadas de significações que produzem saberes e
verdades, indicando formas de pensar, de sentir e conhecer, ensinando as
pessoas modos de ser e de estar na sociedade e na cultura. Procuro também
realizar uma análise a respeito do currículo, considerando-o diretamente ligado
às práticas culturais dos alunos. Após, procuro mostrar a importância de
analisar os filmes infantis como um artefato cultural que assume um caráter
educativo e contribui na constituição de identidade e subjetividade das
crianças. A mídia pode ser considerada como uma instância educativa por ser um
meio de produção e reprodução de discursos, saberes e informações onde circulam
concepções de gênero, classe social, sexualidade, raça, entre outras.
Após, faço a análise sobre as
representações de beleza veiculadas pelo filme Shrek. Nela, mostro como os
filmes infantis fazem circular um discurso sobre o que é ser belo. Na maioria
das vezes, a beleza está associada às princesas. Estas são retratadas como um
modelo de perfeição, com corpos esguios, traços finos e longos cabelos sedosos.
Por fim, retomo algumas considerações
feitas ao longo da análise.
“Máquina de ensinar”
Atualmente, é visível a forte e marcante
presença da mídia na vida cotidiana. Com o crescente avanço tecnológico bem
como a facilidade de acesso da grande maioria da população a este, temos como
resultado a massificação da cultura. Além disso, muitas pessoas utilizam a
mídia como fonte de conhecimento, pois por fazer uso de sons e imagens e por
proporcionar, em alguns casos, uma interatividade do meio de comunicação com o
usuário, transforma-se num atrativo maior do que o livro.
Diante desse quadro, percebemos o quanto a
mídia acaba assumindo um importante papel na educação das pessoas por tornar-se
uma nova “máquina de ensinar”, expressão usada por Giroux ( GIROUX, 1995). As
informações contidas nos programas, reportagens, revistas, jornais, desenhos
animados, Internet, entre outros meios, constituem-se de discursos cujas
mensagens são tomadas como verdades.
Rosa Fischer, em suas pesquisas, mostra que
a mídia torna-se um dispositivo pedagógico na medida em que ela participa da
constituição de identidades e subjetividades por veicular imagens que “de
alguma forma se dirigem à ‘educação’ das pessoas, ensinando-lhes modos de ser e
estar na cultura em que vivem” ( FISCHER, 2002: 153). A mídia acaba por ser uma
instância social que produz e reproduz conceitos sobre os mais variados
aspectos, valorizando um tipo de comportamento. Com isso, acaba tornando-se
“uma forma de regulação social que reproduz padrões mais comumente aceitos em
uma sociedade”( SABAT, 1999:245).
As representações de gênero, sexualidade,
raça, etnia são “consumidas”, tendo como principal referência modelos
hegemônicos, que estão de acordo com interesses da classe dominante. Assim, negam-se
as diferenças culturais e se estabelece um padrão a ser seguido. O modo como
aprendemos a ser, a comportar-se, a vestir-se se constitui com a ajuda inegável
dos meios de comunicação.
Essa produção e reprodução de saberes e
discursos nas diversas instâncias culturais, bem como a veiculação de produtos,
destinado às crianças, nos meios de comunicação apresentam uma forte ligação
com a prática educativa e com o currículo escolar (FISCHER, 2002).
As crianças, por também terem seu processo
de formação da subjetividade e identidade influenciadas pela mídia, acabam por
trazerem para a sala de aula situações presenciadas ou vividas, que muitas
vezes acabam tornando-se significativa para ela e para a turma. Situações como
estas também devem ser consideradas pela professora como parte do currículo
escolar por fazerem parte da realidade das crianças. Este já não deve ser
considerado apenas como uma mera listagem de conteúdos a serem ensinados, pois
é somente a isso que ele, tradicionalmente, é associado. Conforme Bujes, os
Estudos Culturais apresentam o currículo como parte da cultura que o aluno traz
para a sala de aula. Os conteúdos escolares seriam o “produto de uma seleção
efetuada no seio da cultura”(BUJES, 1999: 161). A seleção é de acordo com a
relevância frente a um momento histórico, porém a cultura também determina sua
seleção, por que “é através do currículo que os diferentes grupos sociais,
especialmente os dominantes, expressam sua visão de mundo, seu projeto social,
sua ‘verdade’” ( CORAZZA, 1998: 25). O currículo tradicional acaba por
privilegiar alguns estudantes, reforçando a desigualdade de outros, negando as
diferenças culturais existentes em uma sala de aula. Conceber o currículo como
um artefato cultural é considerá-lo como uma prática social que produz
significações e identidades, valorizando assim as diferenças culturais
decorrentes da raça, sexualidade, etnia, etc.
A educação não se dá apenas nas escolas,
mas também em outras instâncias sociais e culturais como shopping center,
brinquedos e brincadeiras, filmes, desenhos e programas infantis. Fora da
escola, a criança convive com uma gama de informações vindas dos mais diversos
meios de comunicação e que muitas vezes levam isso para a sala de aula.
Um dos principais aparatos da mídia trazido
para sala de aula, principalmente na faixa etária dos 2 aos 8 anos, mais ou
menos, são os filmes infantis. Estes acabam sendo usados como entretenimento
durante o recreio com chuva ou como instrumento pedagógico para ensinar algum
conteúdo (ex: assistir ao filme Vidas de Inseto para se estudar os insetos ou
Shrek para entender a vida nos castelos, situações por mim vivenciadas). Porém,
esses filmes infantis também fazem circular discursos e representações que
auxiliam na constituição das identidades e subjetividades das crianças e também
dos adolescentes.
Giroux escreveu alguns textos sobre a
importância de considerarmos os filmes infantis como um artefato cultural. O
próprio título de um deles “A Disneyzação da cultura infantil”, já permite
pensar na forte supremacia dos filmes da Disney na cultura das crianças. Por
fazerem uso de cor, sons e movimentos, cada vez mais aperfeiçoados pelo avanço
tecnológico, os filmes infantis são considerados bons para as crianças pois
“estimulam a imaginação e a fantasia, reproduzem uma aura de inocência e
saudável aventura” ( GIROUX, 1995:51), construindo uma cultura de alegria para
elas.
Cabe também mencionar o quanto os filmes da
Disney estimulam o consumismo das crianças. Além do filme, é colocado à
disposição no mercado diversos produto relacionado a ele como artigos para
festa de aniversário, brinquedos em geral, materiais escolares, entre outros. A
publicidade encarrega-se de veicular propagandas que seduzem as crianças
fazendo-as quererem adquirir tais produtos.
Talvez, devido ao fato dos desenhos
infantis estarem associados ao lúdico e ao prazer, estes produtos culturais
acabam sendo considerados “inocentes” demais para merecerem uma atenção e
análise de estudiosos. Porém, os Estudos Culturais nos mostram a necessidade de
tomarmos a indústria da mídia como uma pedagogia cultural, sendo assim um
possível objeto de análise.
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